Futuro secretário especial para reforma tributária do governo Lula diz acreditar na mudança, mas ressalva que decisão cabe ao Congresso
O economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e futuro secretário especial para reforma tributária do governo Lula, diz estar confiante na aprovação da reforma tributária sobre consumo em 2023. A declaração foi dada ontem no debate virtual “Desafios do IBS: experiência internacional do IVA”, promovido pelo CCiF. O economista salientou que foi provavelmente sua última participação em evento do think tank até a ocupação do cargo no governo federal a partir do ano que vem.
“Não é fácil, mas estou confiante de que vamos finalmente aprovar uma boa reforma da tributação no consumo no Brasil em 2023”, disse ele, ressalvando que “a última palavra é do Congresso”. Appy lembrou que o debate para isso começou na Constituinte de 1988, quando se perdeu boa chance para a reforma. “Acho que finalmente esse processo, após 35 anos, vai se completar no ano que vem. ”
Appy foi um dos autores do texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019. Este projeto e a PEC 110/2019 foram as principais propostas debatidas nos últimos anos para uma reforma na tributação sobre consumo. As duas PECs propõem o estabelecimento de um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), no modelo de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), não cumulativo, cobrado no destino e com objetivo de ter alíquotas mais uniformes.
Também participando do evento, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) considerou “auspiciosa” a indicação de Appy para o novo governo. A pauta principal para 2023, disse, é a reforma tributária. Ribeiro foi relator do tema na Câmara dos Deputados. Ele chegou a apresentar no início de 2021 relatório à Comissão Mista formada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. A comissão tinha por objetivo chegar a um texto de consenso entre a PEC 45/2019, a PEC 110/2019 e o Projeto de Lei 3.887/2020, que propôs a unificação dos federais PIS e Cofins. Atualmente em tramitação no Senado, a PEC 110 está sob a relatoria do senador Roberto Rocha (PSDB-MA).
A tramitação da PEC 110/2019 avançou mais ao envolver o IVA dual e, da mesma forma que a PEC 45/2019 teve apoio unânime dos governos estaduais, lembrou durante o evento Melina Rocha, diretora de cursos na York University, no Canadá. Ela ressaltou que o projeto propõe, de forma inovadora, a criação de um conselho federativo para garantir a autonomia de Estados e municípios. A criação desse órgão, lembrou, foi sugerida por Nelson Machado, professor de economia da FGV e diretor do CCiF.
Para Appy, a experiência acumulada nas discussões do Congresso em torno das PECs será importante para a configuração do texto final de uma boa reforma tributária.
Vanessa Canado, coordenadora do núcleo de pesquisas e tributação do Insper, apontou que um dos grandes desafios no debate do IVA é esclarecer o efeito do crédito financeiro no cálculo da alíquota efetiva do tributo, principalmente em ramos que ainda resistem, como o de empresas que prestam serviços a outras empresas.
O evento contou ainda com apresentação da portuguesa Rita de la Feria, professora de direito tributário da University of Leeds, no Reino Unido. Ela abordou o que considera “mitos” sobre o IVA. Um deles é de que esse tributo seria ultrapassado. Segundo Rita, o IVA vigora hoje em mais de 160 países, ainda continua sendo implementado e o único caso de país que implantou o imposto e voltou atrás foi a Malásia, por questões específicas de créditos acumulados.
Rita também defendeu um modelo de “IVA progressivo”, alvo de estudo em elaboração em parceria com o economista do Fundo Monetário Internacional (FMI) Artur Swistak. O estudo, diz, verifica os efeitos de uma devolução do IVA para a população mais pobre, considerando um imposto com alíquota única e sem isenções ou reduções de base. Uma devolução imediata, em tempo real, explica, torna a arrecadação mais eficaz e reduz a desigualdade social. A PEC 45/2019, diz, propôs mecanismo de devolução do IVA aos mais pobres, mas não em tempo real, algo que exige sistema sofisticado de administração tributária, condição que, para Rita, o Brasil tem.
Fonte: Valor Econômico