Num momento em que a crise econômica agrava a situação das contas públicas em todo país, o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), assinou no fim de janeiro um decreto (nº 8.548) que prevê a cobrança de ICMS sobre parte da soja e do milho comercializados no Estado ou no país por empresas do setor do agronegócio. E, pela nova regra, as exportações desses grãos acima dos limites estabelecidos pelo governo goiano também serão oneradas.
Segundo a secretária estadual de Fazenda, Ana Carla Abraão, a medida já era prevista em normas administrativas até o ano passado, conforme os termos de um regime especial por meio do qual as empresas (indústrias e tradings) assumiam a condição de substituto tributário e, com isso, a responsabilidade de produtores e cooperativas fornecedoras pelo pagamento do ICMS em operações anteriores. Trata-se de um modelo diferente do que vigora em Estados como São Paulo, Mato Grosso ou Paraná, onde o tributo é cobrado automaticamente nas operações de compra e venda ao longo da cadeia.
Ana Carla afirmou que esses acordos, contudo, não tinham poder de lei. Na prática, disse, uma trading, por exemplo, podia exportar 100% da soja in natura que comprasse de produtores rurais e, comprovados os embarques, ganhava isenção de ICMS sobre esses volumes, sem ter destinado um grão sequer ao mercado interno. Segundo ela, isso gerava pouco excedente de soja e milho para processamento nas indústrias do Estado, motivando algumas indústrias a importar matéria-prima de outros Estados para suprir a demanda necessária para a produção de farelo e óleo.
"Se a empresa agora não cumprir uma cota de no máximo 70% para exportação e 30% para o mercado doméstico, terá que recolher imposto sobre a diferença que exportar a mais", disse a secretária ao Valor. "Não estamos tributando nossas exportações. Só queremos que parte da produção fique aqui, porque temos capacidade industrial para agregar valor a esses produtos". Ana Carla tem uma expectativa de que haverá uma arrecadação adicional de R$ 30 milhões a partir das mudanças que entraram em vigor.
Neste momento, todas as indústrias esmagadoras instaladas em Goiás terão que destinar ao mercado interno ao menos 40% do volume de soja in natura que efetivamente processarem para a fabricação de farelo, óleo ou biodiesel. E pagarão uma alíquota de 17% de ICMS por isso, como já acontece nas movimentações de mercadorias dentro de Goiás ou do país.
Para exportar com isenção de imposto, essas empresas poderão vender ao exterior no máximo 60% do que esmagarem (farelo, óleo e biodiesel). A diferença que superar esse percentual ficará sujeita a ICMS. Esses percentuais só valem para a soja que será industrializada. No caso das tradings, a proporção definida pela Receita Estadual neste momento é que no máximo 70% dos volumes movimentados podem ser exportados sem incidência de ICMS.
A proporção do que deve ficar em Goiás ou no país e o que pode ser exportado precisará ser comprovada pelas empresas a cada seis meses, por meio dos acordos de tributação firmados com a Secretaria de Fazenda.
Contudo, poderá ser revista "de acordo com circunstâncias econômicas do mercado interno e externo do produto", conforme o decreto.
A Aprosoja de Goiás, que representa produtores do Estado, argumenta que os atuais volumes exportados de soja e milho não são elevados e já são suficientes para atender à demanda industrial. Na safra 2014/15, o Estado exportou 41% das 8,9 milhões de toneladas de milho que produziu, e 37,3% das 8,62 milhões de toneladas de soja colhidas, segundo a entidade. No ciclo atual (2015/16), a expectativa é que a produção de soja aumente para 10,2 milhões de toneladas e que a de milho atinja 8 milhões.
Como resposta à medida do governo goiano, agricultores e exportadores consideram ir à Justiça para exigir a derrubada imediata do decreto, vigente desde 29 de janeiro. Eles temem que a medida aumente ainda mais os custos na cadeia produtiva e crie uma "reserva de mercado" para a soja e o milho que não forem exportados, o que teria efeito negativo sobre os preços. "Vamos derrubar esse decreto, até para não deixar que essa medida se espalhe para outros Estados", afirmou Bartolomeu Pereira, presidente da Aprosoja-GO.
Em nota, a Federação de Agricultura de Goiás (Faeg) também repudiou o novo modelo tributário, alegando que ele pode tirar competitividade do Estado e afastar multinacionais como Bunge e Cargill, que ali atuam. E ontem a Faeg viu a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) assumir sua "bandeira", dando ainda mais peso à reclamação.
Em nota, o presidente da CNA, João Martins, disse que a medida goiana "é o início de um movimento que poderá levar à taxação de toda a cadeia de produtos da agropecuária brasileira, numa ação capaz de inviabilizar o setor que sustenta a economia do país e garante emprego no campo e superávits comerciais".
Valor Econômico / Caderno Agronegócio
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