É a primeira decisão que se tem notícia contra a Medida Provisória (MP) nº 1.159, de 2023
Uma empresa conseguiu liminar para manter o ICMS na apuração de créditos de PIS e COFINS. É a primeira decisão que se tem notícia contra a Medida Provisória (MP) nº 1.159, de 2023, que entrou em vigor no dia 1º. A norma determina a exclusão do imposto estadual do cálculo.
O governo adotou essa medida para tentar reduzir a conta de bilhões de reais gerada com a exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS, a chamada “tese do século”. Espera, com a MP, uma arrecadação adicional de R$ 31,8 bilhões este ano e de R$ 57,9 bilhões em 2024.
A liminar foi concedida pelo desembargador William Douglas Resinente dos Santos, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), depois de o pedido da empresa ter sido negado em primeira instância. Para ele, essa alteração não poderia ter sido feita por meio de medida provisória (processo nº 5005005-17.2023.4.02.0000).
No pedido, a empresa alega que, a partir da MP nº 1.159, houve a exclusão, “de forma ilegítima” do ICMS do cálculo, com o objetivo de “limitar e reduzir o crédito das empresas adquirentes de bens e mercadorias”. Ainda segundo a empresa, a não cumulatividade do PIS e da COFINS prevista na Constituição Federal não pode ser alterada por meio de medida provisória. Seria necessário, acrescentar uma emenda constitucional.
A não cumulatividade do PIS e da COFINS é diferente do regime não cumulativo de IPI e ICMS, segundo Sandro Machado dos Reis, sócio do Bichara Advogados, escritório que representa a empresa no caso. Foi alegado na ação, de acordo com ele, que a não cumulatividade do PIS e da COFINS tem como característica a “base sobre base” e o regime do ICMS e do IPI, o “imposto sobre imposto”.
Na liminar, o desembargador federal William Douglas afirma que ficou evidente, com a medida provisória, a intenção do Poder Executivo de compensar a perda de arrecadação decorrente de decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 574706 - exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS.
O julgador considerou ainda que o pedido tinha chances de ser aceito quanto ao mérito e também o risco de dano grave, de difícil reparação, se mantida a exclusão do ICMS do cálculo dos créditos de PIS e COFINS.
A questão dos créditos, segundo Douglas, diminui o alcance da vitória dos contribuintes no STF. “Se eles venceram foi porque tinham razão”, afirma ele, na liminar. Ele acrescenta que, por mais que se entenda a preocupação com as contas públicas e a lógica adotada, efetuar alterações legislativas, ainda mais por medida provisória, é um ato que “precisa ser visto com cautela”.
Nos valores pagos nas aquisições, diz o desembargador, está embutido o ICMS e, portanto, o ônus deste custo é suportado pelo próprio contribuinte. “Se admitirmos que as derrotas fiscais do Estado podem ser supridas pelo próprio vencedor da demanda, não haverá mais serventia em discutir com o Fisco seus exageros e erros.”
De acordo com a advogada Glaucia Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho, o assunto começou a aparecer e deve ganhar corpo até o começo de junho. “Estamos para entrar com os primeiros processos”, afirma. Ela lembra que a MP ainda precisa ser convertida em lei.
Para Glaucia, há possibilidade de questionamento especialmente porque a legislação segue dizendo que o crédito se dá a partir do valor do bem. “Não tem como imaginar o valor do bem sem a inclusão do ICMS”, diz a advogada. Ela acrescenta que a não cumulatividade do PIS e da COFINS nunca teve racional econômico.
Por nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional da 2ª Região (PRFN da 2ª Região) informa que acompanha os processos relacionados à MP nº 1.159/2023 e irá recorrer da decisão. Essa é a única decisão de mérito concedendo liminar no âmbito do TRF da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), segundo a procuradoria. Por ser liminar monocrática, deve passar pelos demais integrantes da turma.
Na primeira instância da 2ª Região, a PRFN monitora sete processos protocolados sobre o assunto. Nessas ações ainda não houve análise de mérito, os juízes apenas negaram as liminares por ausência de “perigo na demora” - uma das condições para se conceder uma decisão provisória.
Fonte: Valor Econômico