Para Fisco, despesas após a finalização do processo de produção não seriam insumos
A Receita Federal barrou a possibilidade de uma indústria de bebidas aproveitar créditos de PIS e Cofins sobre gastos com papel filme e papelão usados para compactar e transportar conjuntos de latas ou garrafas. A decisão está na Solução de Consulta nº 177, publicada pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit).
Segundo o Fisco, apenas os bens e serviços usados na produção e que sejam relevantes ou essenciais podem gerar créditos de PIS e Cofins. As despesas feitas depois da finalização do processo de produção, acrescenta, não seriam consideradas insumos.
“Dessa forma, o papel filme e o papelão utilizados para fins de transporte de mercadorias não são considerados insumos, vedando-se o cálculo de créditos sob esse título na apuração não cumulativa da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins”, diz a Receita Federal na solução de consulta.
A orientação vem no contexto de alta judicialização sobre os gastos que podem gerar créditos para fins de abatimento do montante a ser recolhido de PIS e Cofins no regime cumulativo, em que se exige alíquota de 9,25% sobre o faturamento das empresas.
Advogados tributaristas questionam a orientação. Afirmam que vai contra o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, em recurso repetitivo, definiu que o conceito de insumos para fins de tomada de crédito é a essencialidade ou relevância do bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica do contribuinte (REsp 1771170).
“Não vejo essa clareza toda de que o STJ restringiu o creditamento para gastos empregados no processo produtivo. A Corte fala muito em atividade econômica”, pontua a tributarista Thais Veiga Shingai, do Mannrich e Vasconcelos Advogados.
Segundo ela, caberia uma discussão sobre o que é o processo produtivo. “Para a Receita, ele acaba quando a lata de cerveja fica pronta, por exemplo.”
A autoridade tributária embasa o entendimento restritivo na decisão do STJ. Cita que, pelo Parecer Normativo Cosit nº 5, de 2018, os gastos com embalagens para transporte de mercadorias acabadas não podem ser considerados insumos. O parecer é uma análise da Receita Federal sobre a aplicação do julgamento do tribunal superior.
“A Receita não considera que a indústria utiliza o material para que as garrafas não batam. Além disso, ao acondicionar as garrafas em packs de 6 ou 12 acaba transformando o produto em outro, que será ofertado ao consumidor”, afirma Leonardo Castro, sócio do Bueno e Castro Tax Lawyers.
De acordo com o relato da indústria de bebida alcóolica feito na consulta, os materiais de embalagem seriam “imprescindíveis” na última etapa do processo de industrialização porque é o que viabiliza o transporte da mercadoria, que é frágil.
Esses materiais, acrescenta a fabricante, também têm a função de acondicionar as bebidas em lotes destinados à venda. A paletização, afirma a empresa, seria a última etapa da atividade na fábrica antes da saída da mercadoria para os distribuidores e varejistas.
No Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), existem decisões isoladas sobre o assunto. Em 2019, por exemplo, a 3ª Câmara da 2ª Turma Ordinária permitiu que o contribuinte se creditasse com gastos de papel extensível, etiqueta de papel, caixa de papelão e papelão (processo nº 13502720469/2012-00).
O advogado Leonardo Castro chama ainda atenção para o fato de que, na consulta, a Receita nega o creditamento de PIS e Cofins, mas deixa espaço para a tomada de créditos do IPI sobre os mesmos gastos, caso o contribuinte prove que utiliza os materiais no processo produtivo. “É contraditório e até esquizofrênico.”
Fonte: Valor Ecônomico